domingo, dezembro 09, 2012

Oréade.


                Havia um homem que morava ao pé de uma montanha. Ele era só. Sempre viveu só. Curiosamente subia todas os dias aquela montanha de pedras escorregadias e pontiagudas.
                Além de sua vida absurdamente solitária. Chamava muito a atenção dos moradores, o estranho costume que ele tinha de subir, quase todos os dias, aquela montanha.
                Curiosos, os moradores escolheram uma pessoa para descobrir o estranho motivo que aquele velho tinha pra subir a montanha. Decidiram que no próximo dia, o escolhido iria seguir o velho até o topo, escondido e descobrir tudo.
                No outro dia, como de costume, o solitário velho se preparou para a íngreme subida. Não era fácil. Pedras afiadas e pontiagudas botavam a vida em risco. O curioso sumia escondido alguns metros atrás. Depois de um bom tempo, já com os joelhos e mãos machucados o velho chegou ao topo da montanha. Fechou os olhos sentindo as caricias do vento. Tomou folego e gritou para a cordilheira – Eu te amo.





Texto e ilustração: Cayo Cé.

segunda-feira, novembro 19, 2012

Quem ama, ama porque o amor transborda de si.
Não cabe em um só peito, até que acha outro que também transborda
então se enchem, se saciam e matam eternamente a sede sem fim.

Mas há os que amam porque lhes faltam amor. Cuidado.
E ela sofria enquanto cantava suas próprias dores.
E na música ela contava todas. Uma a uma. Um numero enorme.
Um numero incrível de musica e lagrimas.
O palco era a lista de seus sofrimentos.

domingo, novembro 18, 2012

Minha boca sangra malditas palavras não ditas
que trazem ao paladar o gosto metálico e exótico do arrependimento.

terça-feira, novembro 13, 2012

Cacofonias e repetições

Quero ver, quero ver tudo
ver além, além de tudo.
Quero cegar, cerrar meus olhos.

Quero sentir, sentir de tudo
tocar a alma, tocar o mundo.
Quero sarar, trocar a pele
a carne viva, a flor-da-pele.

Quero escutar, ouvir a alma.
Cortar os tímpanos, ouvir mais nada.

Quero falar, cantar o mundo.
Quero calar, fechar a alma.

sexta-feira, outubro 19, 2012

Saiba; eu posso ter alergia ao remédio que lhe tira a dor de cabeça.

O que lhe cura, pode me envenenar.

segunda-feira, outubro 15, 2012



Queria ter virado uma pintura rupestre.
Ficado pintado lá nas paredes do Catimbau.
Correndo sem cabeça por seis mil anos.

Ou uma pedra. Vivendo inerte por milhões de eras.
Vez ou outra rolando pela ribanceira, clímax da vida.

Ou apenas virado uma brisa. Ajudar uma folha seca a chegar no chão e sumir.

sexta-feira, outubro 05, 2012

Ter Sol nos olhos.
 Dói como qualquer dor, qualquer paixão ardente.
 Dói como raio arrebatador, como fuligem cósmica nos olhos.
Terçol na alma, nas suas janelas.

domingo, setembro 09, 2012

Sou negro de cor, europeu de odor e índio de terra.
Todos cantem, todos cantam.
Sou dança, poeira e sangue.
Sou terra, suor-mar, sou rio.
Sou pedra de ouro, madeira de sangue e tambor de kalangu.
Sou terra e além mar.

Todo o céu que lhes guardem.
Todo canto que os assopre.
Toda vela que os leve, que os vele, que os vale.

Sou pai, filho e espirito santo. Amém.

quinta-feira, junho 28, 2012

Na mesmice do marasmo
sento na noite do não fazer
E nessa madrugada fria
espero amanhã ser

Conservo-me na nem inercia

domingo, maio 20, 2012

Um grande teste

                Era um dia decisivo. Depois de anos de treinamento um aprendiz iria ser testado pelo seu mestre. Foram anos de exercício árduo na mais especifica arte marcial. Um exímio lutador. Então seu mestre chegou trazendo um robusto bastão de bambu, uma das armas mais bem manejadas pelo aprendiz.

-Mandei colocar um grande tigre dentro daquele cômodo. – disse o mestre e enquanto entregava a arma, falou – Vá, quero ver se você é capaz.

                O jovem fez uma grande reverencia e seguiu indômito. Entrando numa grande sala, viu sentado no cato um grande tigre. Sim, bastante grande, mas velho. Era um tigre que já não era tão feroz. Também percebeu que suas garras estavam serradas. E suas duas principais presas, arrancadas.

-O que será isso – pensou o aprendiz – por que colocaram um tigre nesta situação?

                O tigre, mesmo velho, avançou com sua ferocidade selvagem pra cima do aprendiz. Desviando da primeira investida o aprendiz começou a colocar seus ensinamentos marciais em pratica. As investidas eram ininterruptas. Quanto mais ele batia, mais raiva sentia por terem colocado um tigre moribundo, que pra ele não oferecia perigo nenhum. O tigre não resistiu e morreu. Ainda com raiva, o aprendiz saiu da sala. Arrastava com certa dificuldade o pesado tigre. Soltou na frente do mestre e esperou os congratulações em reverencia. O mesmo simplesmente olhou para o tigre e comentou:

-Não achei que você seria capaz.

                Jamais se encontraram novamente.

quarta-feira, abril 11, 2012

Um alento de contato, entre os filhos dos olhos
Uma lente de contato, entre os cilhos alados

-O pêlo que guarnece a beira das pálpebras dos homens e dos macacos.
Cayo Cé

segunda-feira, março 05, 2012

Des[a]prender

                Dois gnomos liam bastante. Gloin lia um livro, colocava no chão de frente a estante e pegava outro. Quanto mais ele lia, mais aumentava a pilha de livros em que ele estava sentado. A estante de livro era altíssima, não faltavam títulos. Enquanto Gloin acumulava livros e já estava a 5m do chão, via que além dos muros do labirinto, havia um mundo. E cada vez que ele lia mais e ficava mais alto, mais o conhecia.

                Enquanto isso, Trufo lia um livro calmamente. Depois de ler, rasgava o livro em pedacinhos e jogava num cesto. Gloin, além de achar o ato do amigo um absurdo, achava o próprio amigo muito ignorante. A torre de livros de Gloin já passava os muros do labirinto e agora ele tinha que pescar os livros na prateleira La em baixo. E via o amigo burro lendo um livro, rasgando e jogando em um cesto.

                -Você é muito ignorante Trufo - gritava Gloin com um pequeno alto falante de latão - Não vai chegar a lugar nem um assim! Daqui posso ver as montanhas e acho que em pouco poderei ver o oceano. 

                Trufo já tinha rasgado uma quantidade incontável de livros. De lá de cima, com sua pequena luneta, Gloin o via jogar água e cola dentro da bacia empanturrada de papel picado. Gloin tinha lido um livro, riquíssimo, sobre reciclagem de papel e percebeu logo o que o amigo estava fazendo.

                -Você é mais burro do que eu imaginava Trufo - gritava Gloin, desesperado para ser ouvido - só tem eu e você nesse labirinto, você vai escrever pra quem rapaz? Daqui já consigo ver uma coisa azul, não sei ao certo se é um lago ou se já é o oceano, mas você está perdendo de conhecer as coisas jogando tudo fora assim!

                A pilha de livros de Gloin já chegava a quase tocar as nuvens. Bambeava um pouco, dava até medo. Mas Gloin se vangloriava de poder ver tanta coisa, observar tantos detalhes. Sim, estava um pouco chateado de não ter mais o amigo pra conversar, mas é por que ele ficou tão burro lá em baixo... Enjoou de olhar pra uma montanha e foi ver o que o amigo estava fazendo. De longe, viu Trufo ascendendo uma pequena chama.

                -Aquele louco agora ta queimando papel? - Se espantou Gloin, que quase se estabacou de cima da sua pilha de conhecimento. - Agora já passou dos limites da ignorância, a obtusidade de Trufo chegou ao seu limite extremo. É um caso de esquizofrenia paranoide aguda, sem duvida - Gloin tinha lido um livrinho sobre psicologia. - Trufo seu ignorante você agora ta queimando pap...

                Foi quando Gloin viu uma coisa que nunca tinha lido.

                Todo aquele papel virou algo que parecia uma lâmpada, um jarro de ponta cabeça ou uma gota que pingava pro céu. Era branquinho, branquinho. Aquele papel todo, cheio de palavras, com as informações mais preciosas, tinha se transformado em um lindo... como era mesmo o nome? Balão. Trufo subia em uma velocidade espantosa, um foguinho na boca do balão aquecia o ar e, como Gloin tinha lido, o ar quente era tão mais leve, mais solto, desprendido. Ele que tinha aprendido tanto...


                Em poucos segundos o balão se igualou à Gloin e Trufo disse.
                -Adeus amigo, agora vou conhecer o mundo.”

quarta-feira, fevereiro 15, 2012

Ode a puta (ou Odete, a puta.)

Eu que durmo de quarto em quarto
Sinto o peso das minhas excamas
Sinto o peso de suas exmolas
O brilho fosco de minhas exquinas
Os rasgos molhados dos meus vestidos
                                                            [trocados de noite em noite]
Sinto os fidalgos perdidos jogados de sanidade vã
Que se esvaem de mim como sêmen
Como são, como não são, como não sou. Como não sã
Iansã que me toma no leito e me acalenta o peito, mordido
Santa Barbara que me aquece o ouvido
Me lembra que de meu peito não sobrou nem o hímen.

Odete Gomes

terça-feira, janeiro 10, 2012

Sabe quando você se mergulha
Quando você se bebe
Quando se derrama
Quando é choro e quando é onda
Sabe quando se é liquido a escorrer pela esquina,
pela escada
Pelo fim, pelo meio, pelo fio
Sabe quando é vapor, fumaça de gelo
Sabe água?
Sabe fluido morno que dá vida
Sabe sopa, sabe mar?
Sabe quando seca
Sabe quando sede, quando cai em cachoeira?
Sobe nuvem? Desce chuva.
Sabe água?

Seja litros.

domingo, janeiro 08, 2012

Dei um tiro no meu pé
No grito, comecei a filosofar.