Vesti o umeral e solenimente retirei o relógio do alto da parede. Não ousaria toca-lo. Sem baixar os braços fui à cômoda. Já deixara a gaveta mais alta aberta. Não olhei a hora, não ousava olhar a hóstia do tempo. Acomodei-o numa delicadeza desconhecida, mas corajosa. Não hávia corporal, foi direto na gaveta. Traquei depressa. A cômoda, agora sacrario do tempo, me transmitia um pavor tremendo. Dali em diante não comunguei do tempo. Vivi alheio à velhice e à mocidade. Deus me perdoe pela fuga.
Cayo C.
terça-feira, junho 17, 2025
sexta-feira, maio 23, 2025
Mas não simplesmente deixa-la ir,
parar de sentir
Quero senti-la sufocando
agonizante
Entre meus dedos rijos e disformes
E afoga-la nesta baba venenosa
e no choro catarrento
Mata-la. Esgana-la.
Não quero paz
Eu quero a guerra assassina
Matar a única que me põe no colo.
Acabar, contudo.
segunda-feira, maio 05, 2025
Pássaros Platônicos
um beija-flor na relva
Conheci uma revoada
Lindas aves de liberdades
próprias (e de próprias
também prisões)
já é ninho. Galho seguro
E nuvem branca
do beija-flor
Trouxe o riso
Um bando de sorrisos
a povoar o dia
quarta-feira, julho 10, 2024
Fêmur
Passava das quatro horas da madrugada, já suava o equivalente a três mudas de roupa. A tela do computador bronzeara seu rosto levemente, o que era algo a se alegrar. O Sol, que não viu nascer nem se pôr, não teve a mesma oportunidade. O cursor intermitente piscava mais vezes que os próprios olhos. E a tela em branco.
Um branco cada vez mais branco. Um branco profundo, quase negro. Quase negro de tão profundo. A verdade é que tinha muita coisa no espaço entre sua mente e a ponta dos seus dedos. Mas algo, uma barreira invisível, impedia tudo aquilo de ser despejado no teclado. Nenhuma ideia era boa o suficiente para Rodrigo. Doía. Doía só de pensar em escrever aquelas ideias torpes.
Ele tentou a primeira palavra. Doeu tanto que ele sentiu, desta vez realmente, uma pontada na coxa direita. Aquela ideia péssima tocou a realidade pela primeira vez. Então, escreveu a segunda palavra. Ah! A dor foi lancinante. Parecia que uma brasa quente perfurava a calça jeans. Mas não desistiu. Enquanto digitava, gritava. A dor de colocar aquela ideia, aquela péssima ideia — o que as pessoas iram achar? Como doía. Mas escrevia, não parava. Cada palavra acompanhava, concomitantemente, uma lágrima e um gemido. Até que parou no ponto final do penúltimo paragrafo.
Sua coxa, aberta em carne viva, exibia, liso e alabastrino, o osso. Sem uma mácula rubra sequer. Branco como a página de minutos antes. Era a exposição final da brancura, o branco mais íntimo. Que se esconde por debaixo de toda camada. Piscava o cursor intermitente. Era necessário prosseguir.
O indicador pousou sobre o enter. Quebra de linha. O osso trinca, dividi-se em dois, o grito. Um urro. A quebra. Finalizou o texto. Leu. Realmente era ruim. Apenas isso. Um texto ruim. Respirou, limpou o suor. Respirou novamente. Se levantou, tomou uma água e foi à janela. Sentiu a brisa da alvorada. Tudo estava inteiro e funcionando bem. Foi só um texto ruim, haverá vários outros.
Foi dormir esperando que um dia eles fossem apenas isso.
24 de junho de 2020
quinta-feira, julho 04, 2024
sexta-feira, maio 03, 2024
O Segredo e a Maçonaria - por um não maçom
Talvez o aspecto mais famoso da maçonaria, carro chefe de todos os outros, é o seu caráter sigiloso e todos os segredos e mistérios que guarda. Um dos motivos para cultura popular construir um complexo e suntuoso sistema de crenças, impressões e teorias conspiratórias em volta desta antiga e conhecida — talvez não tão bem conhecida — instituição.
O problema do mito como inverdade
Digamos que eu tenha uma caixa. Enquanto esta caixa permanecer fechada, dependendo do meu grau de eloquência, posso convencer uma plateia que dentro dela contem quase qualquer coisa que eu queira. Se eu disser que dentro da caixa há uma pedra, não teriam motivos para duvidar. Mas, caso eu diga que esta pedra é preciosa ou que, na verdade, dentro desta caixa há muitas pedras e objetos mágicos, provavelmente você duvidaria. O problema é que, você poderia até não acreditar, mas muitas outras pessoas poderiam acabar acreditando.
Bem, digamos que eu tenha falado sobre as pedras preciosas e itens mágicos de dentro da caixa de modo muito convincente. Se o discurso foi realmente bem contado, mesmo quando eu abrir a caixa e mostrá-la vazia, poderá have uns que acreditaram tanto na história que dirão “Então esta caixa não é a verdadeira. A verdadeira caixa contem itens maravilhosos dentro dela. Vamos atrás da verdadeira caixa! ” A partir daí eu não tenho mais nenhum controle sobre o mito que criei. Grupos poderão se organizar para ir em busca do baú mágico cheio de itens maravilhosos, que na verdade nem existe. Mas claro, isso é uma pequena alegoria que eu acabei de inventar, nunca aconteceria na realidade. Ou aconteceria?
Esse é o problema do mito quando ele é apenas uma história falsa, um conhecimento inverídico sobre algo. Sem nenhuma das características de um verdadeiro mito, com profundidade simbólica, poder transformador, raízes arquetípicas, tradição. Ou seja, apenas uma mentira, que muitos acreditaram. Muitas vezes, a maçonaria passa a ser esta caixa. — mas que com certeza, não está vazia.
Fenômeno comum
Antes de falar da maçonaria, queria falar de outras instituições, ou melhor, antes mesmo de falar dessas instituições, queria dividir uma memória. Quando eu estava aprendendo a ler e escrever, não sabia nada do que iria aprender nos próximos anos, nas séries mais avançadas. Para mim, era um absoluto desconhecido o que aqueles meninos mais velhos aprendiam. Certo dia, uma professora de reforço escolar chegou para mim e disse: “Cayo, vou te ensinar um segredo. É algo especial e se chama parágrafo. Sempre que começar um assunto, você deixa o espaço de um dedo na linha. Assim, as pessoas irão saber que você começou um novo assunto.” Eu tinha acabado de aprender sobre o espaçamento de parágrafo e achava que tinha descoberto o mundo. No colégio, sempre é um segredo o que acontece nas turmas à sua frente. Mesmo que eu pegue os livros das séries mais avançadas, provavelmente não entenderia nada, — por sinal, sempre folheava, no começo do ano, os livros didáticos e sentia um misto de desespero e curiosidade para aprender tudo aquilo que não entendia. — As séries que se passavam, iam perdendo a graça. O interessante é o que não se conhece, o segredo a ser descobertos nas próximas séries.
Bem, falando agora de instituições. Onde não há segredos? Toda empresa tem seus segredos, que guardam os projetos ainda a serem implantados. Qual o partido político que não tem suas reuniões de caráter sigiloso? Alguém tem mais reuniões secretas que padres em seus confessionários ou psicólogos em seus consultórios? E a instituição família? Com quantos anos você pode ter acesso ao conhecimento sobre sexo? Você, independente da sua idade, realmente acha que conhece todas as histórias que aconteceram com seus pais antes, e até depois, de você nascer? Qual escola de samba que revela seu enredo antes da hora? Você acha que todo aluno conhece os planos que seus professores têm para ele? O segredo é algo diariamente presente nas nossas vidas nos mais diversos modos, ocasiões e necessidades. Desde uma reunião partidária até uma festa surpresa. E todos eles só são revelados para as pessoas certas e que estejam preparadas para ter acesso a ele. Toda equação matemática é um segredo, até ser concluída, todo texto é inevitavelmente um mistério, até você acabar de lê-lo. E você só terá acesso a estes segredos se souber ler e entender, e se for até o final. Você só conhecerá os segredos da literatura, caso seja iniciado na gramática. Com a maçonaria não é tão diferente.
São várias as instituições que tem o sigilo como parte integrante do seu funcionamento. A psicoterapia, a confissão dos pecados, a relação do advogado com seu cliente, contratos de sigilo empresarial. O EJC (Encontros de Jovens com Cristo), evento cristão comum entre católicos e protestantes, que reúnem jovens para um evento que é sigiloso, e só os encontristas — nome dado aos iniciados do evento — sabem o que se passa lá. Eu já participei de dois ritos de iniciação em palhaçaria, onde o estudo do palhaço clássico se desenvolvia num curso onde tudo que acontece lá, era absolutamente sigiloso e não deveria ser comentado fora do curso, nem com entre os próprios participantes.
Mas qual o sentido de nenhum destes segredos citados chamarem tanta atenção como os da maçonaria chama? Bem, observo que são vários motivos. Um deles são os mitos criados em volta da maçonaria, sem dúvida, o maior dos motivos.
Só para iniciados
A maçonaria é uma ordem iniciática, ou seja, é necessário ser iniciado para ter acesso a certos elementos dela, como toda ordem iniciática. A iniciação está presente em todas as civilizações humanas, desde as mais isoladas tribos aos grupos mais globalizados. São rituais que marcam a transição de um estado para outro. O Baile de Debutante de uma adolescente ocidental, por exemplo, é o ritual de iniciação da jovem moça na vida adulta. O casamento, marca a mudança da vida de solteiro para uma vida em matrimonio. São diversos os rituais de iniciação que os humanos lançam mão, para marcar estes momentos de transição.
As Ordens Iniciáticas, por sua vez, lançam mão deste elemento para marcar a entrada do indivíduo nesta ordem e com isso, lhe dar acesso a questões especificas de cada ordem. Podendo aparecer como desafios que o adolescente precisa superar para fazer parte da turma, irmandades acadêmicas e até instituições antiquíssimas como a Igreja Católica, Maçonaria ou qualquer instituição que necessite de uma iniciação para se participar.
Esta iniciação restringe os não iniciados ao acesso de rituais, conhecimentos e diversos outros aspectos. Na Igreja Católica, por exemplo, você só tem acesso aos demais rituais sacramentais, caso tenha passado pelo do batismo, um ritual sacramental que simboliza a morte e ressurreição, — tal qual Cristo — tornando o iniciado uma nova criatura e só estas novas criaturas tem acesso aos demais sacramentos (Crisma, Eucaristia, Confissão, Unção dos Enfermos, Ordenação e Matrimônio). Cada instituição iniciática terá seus motivos e seus meios de dar acesso ao iniciado às questões daquela ordem, sejam estas questões sigilosas ou não.
A necessidade de ser secreta
A maçonaria, independente de outras coisas, teve a necessidade pungente de, em diversos momentos da história, ser realmente secreta. Mas como é bem dito por todo maçom hoje, a maçonaria não é mais secreta. Primeiro, pelo motivo óbvio; todos sabem que ela existe, conhecem seus membros e até seus conhecimentos são de relativo acesso em livros e sites com temática maçônica. Mas o que fez a maçonaria ser secreta por tanto tempo? Além dos mistérios e dos mitos, a maçonaria sempre foi progressista e lutou para desmantelar muitos governos despóticos. Com isso, foi perseguida pelos nazistas, Igreja Católica, comunistas e diversos governos absolutistas. No Brasil, quando a coroa de Dom Pedro I começou a temer a queda da monarquia na troca para uma república, a maçonaria foi proibida e caçada. Cuba também perseguiu os maçons e ainda hoje há leis e projetos de leis que pretendem obrigar políticos maçons a declararem sua participação na ordem.
Além das questões políticas há também as pressões ideológicas e teológicas. A Igreja Católica, temendo o contato dos seus fiéis às ideias que tendem a certo relativismo e aceitação ecumênica, puniu por mais de um século com excomunhão automática qualquer católico que entrasse na maçonaria. Hoje, mesmo que a excomunhão não seja tão mais frequente, ainda é considerado pecado sério, afastando o fiel à eucaristias e diversas outras restrições institucionais. Tudo isso, e mais outros elementos, obrigava a maçonaria a ser pragmaticamente secreta, para fugir da perseguição antimaçônica. Mas aquém disto, a maçonaria hoje segue sendo discreta, tendo seus sigilos e guardando seus mistérios.
Didática
O conhecimento da maçonaria é de caráter iniciático e progressivo. Assim que se adentra à ordem, o então aprendiz começa a ter acesso a símbolos e seus significados, vivenciando-os em ritualísticas, tal qual se faz na santa ceia para os protestantes (pão simbolizando o corpo de Cristo e o ritual de come-lo e beber o vinho, que simboliza o sangue de Cristo) ou de nossos aniversários (velas como símbolos dos anos que passaram e o ato de assopra-las). Porém, na maçonaria há uma progressão, por ser uma instituição de instrução, como uma escola. E entende-se que os iniciados só devem ter contato com os novos conhecimentos na hora certa, para potencializar o método e enraizar questões morais, éticas e filosóficas com maior profundidade.
Isso acontece também em diversas outras instituições, de modos variados. Você lembra que para aprender física você precisava ignorar certos elementos da realidade, como atrito do ar e gravidade? Só assim você poderia calcular velocidades, percursos e tempos de objetos e seus movimentos. E caso você entrar na faculdade, com frequência escutará do professor “Sabe o que você aprendeu na escola? Esqueça tudo.” Obviamente não devemos esquecer tudo, mas aquilo precisa ser internalizado e deixado de lado, para ser base quase que inconsciente de novos aprendizados. Não é diferente na maçonaria.
Porém, a maioria desses ensinamentos podem ser encontrados em livrarias e na internet. Então, afinal, o que ainda é segredo na maçonaria?
Toques, sinais e palavras de reconhecimento
Parece-me que os únicos segredos remanescentes são as formas que os maçons utilizam para reconhecer-se mutuamente. O famoso aperto de mão, frases, siglas e toques, que só iniciados tem acesso. Elementos estes que podem, e devem, mudar com certa frequência. Há, por exemplo, a palavra semestral que é escolhida nas potencias maçônicas, passada em códigos para as lojas e, de modo ritualístico, repassadas para os membros das lojas. Com isso, há uma palavra trocada semestralmente que serve como chave de reconhecimento entre os maçons. E também posições corporais e sinais centenários que são muito bem guardados até hoje. Além disso, os assuntos tratados dentro de loja no dia-a-dia das reuniões também são sigilosos. Todos os maçons dão sua palavra, de que irão guardar tudo consigo.
Mesmo não sendo necessário total sigilo, ainda se espera do maçom, uma discrição própria da ordem. Não só pelo costume e tradição, mas para proteger a própria maçonaria de embustes falaciosos. Quantos pastores não podem ouvir a palavra ritual que logo acusam a maçonaria de práticas escusas, mesmo praticando ele mesmo rituais todos os domingos nos seus cultos? Ou qualquer graduado, que passou pelo ritual de formatura que tem vestimenta própria, com a veste talar, toga e faixa de cor especifica para cada curso. Recitação de um juramento em uma posição especifica (ereto com o braço direito esticado à frente e dedos espalmados), a troca do lado da borla do capelo depois de formado, a imposição do do grau. Tudo isso num nível de importância que caso o ritual não seja adequadamente feito, ninguém terá colado grau propriamente e tudo precisará ser refeito.
Os rituais são diariamente presentes na nossa vida. Desde de rituais menores, pessoais, costumes de casa. Até costumes da família e instituições maiores como as forças armadas, um julgamento no judiciário, esportes etc.
O mais profundo mistério da maçonaria
Existe apenas um segredo realmente profundo e impossível de ser repassado. Segredos que toda iniciação guarda. Este segredo não pode ser passado por palavras, por signos ou por qualquer outro meio que não seja, o da vivência. Tal qual os mistérios da religião, dos mestres de yoga e artes marciais ou tantas outras práticas, o maior segredo da maçonaria reside no coração dos maçons. Sendo impossível repassar aos outros, a não ser por meio de um convite à pratica iniciática, vivencial. Numa imersão psicológica e almática, que só pode ser sentida, nunca contada. Assim como a imersão meditativa do iogue no caminho da iluminação, a presença do Espirito Santo no coração do cristão ou a descoberta de si mesmo na psicoterapia.
Conclusão
A maçonaria segue tradicionalmente discreta. Seja por costume, por conta das necessidades do passado, por didática ou por tradição. Mas qualquer ida a uma livraria, te mostrará dezenas de volumes que esmiúçam os conhecimentos maçônicos. Talvez isso faça abrir uma caixa, qual não contem pedras preciosas nem itens mágicos, uma caixa vazia. Claro, você pode achar que esta não é a caixa verdadeira e repetir a celebre frase conspiratória “isso é o que eles querem que você ache”, e seguir sua busca pela “caixa verdadeira”. Mas saiba que a caixa vazia que você jogou no chão, pode ser símbolo de um receptáculo que diz a você que “o essencial é invisível aos olhos” ou então que “se tua xícara já está cheia, não posso enche-la com meu chá”. Cabe a você decidir o que quer procurar, aonde e como.
13 de março de 2021
Não esqueça de Exu
O herdeiro ao trono de um grande reino, preocupado com seu futuro reinado, resolveu fazer oferendas a todos os orixás. Procurou o sábio da aldeia e pediu auxilio. Este começou a citar a laboriosa lista de itens que o futuro rei precisaria para a quantidade de oferendas que ele precisaria para agradar tantos orixás. Mas o herdeiro estava disposto. Ogum para boa sorte nas guerras, Oxóssi para boa sorte nas caças e agricultura, Oxum para boa sorte no amor, Omolu para afastar as pestes dos seus súditos. A lista era enorme, mas ele ia tomando nota de tudo. E por fim, o Sábio disse:
— E para Exu.
— E em que Exu pode me ajudar? — perguntou ele já preocupado com a quantidade de itens e afazeres que teria de dar conta.
— Exu tende de ser o primeiro a receber homenagens.
— Sim, mas e Exu vai me ajudar em que? — pergunta ríspido.
— Não esqueça de Exu.
O jovem, já impaciente, agradece ao sábio e sai da tenda com muita coisa na cabeça. Os anos foram se passando e de tempos em tempos o jovem fazia as oferendas para algum orixá. Mas não pra Exu. Exu ajudaria em que?
Certo dia, depois da conversa com o seu pai, agora muito ancião, este anuncia que em breve renunciará e ele ascenderá ao trono. Enquanto voltava para casa, já traçando os planos pras cerimônias e festejos, na ultima esquina antes do seu palácio, vê um homem. Era um homem alto, forte e muito bonito. Sorria. Quando cruzou a rua o homem lhe cumprimentou tirando o chapéu, ainda com um sorriso sentou numa pedra. E ali ficou por alguns dias. O príncipe logo esqueceu a cena, foram semanas de cerimônias e festejos.
Tanto tempo se passou, que onde tinha um homem sentado, hoje só se via um montículo de terra. Os anos se passaram. Logo o rei se casou e prosperou. Teve seu primogênito, que cresceu com saúde e coragem. Cuidou bem do reino e de seus súditos. Até que um dia, acometido por sonhos, começou a desconfiar de sua mulher. Ficou tão perturbado que mandou-a embora. Ela, desesperada, é expulsa do castelo e vai se abrigar na casa da irmã. Assim que cruza o montículo de terra que ficava na esquina, o homem, que ainda estava lá sentado por debaixo daquela terra com as mãos no joelho e um sorriso no rosto, se levanta e limpa o pó do corpo:
— Eu sei como fazer seu marido lhe querer de volta. É simples.
— Por favor, me diga, me diga. Eu faço tudo!
— Não precisa de tanto. Exu só quer três fios da barba do rei.
— Três fios da barba?
— Sim. É suficiente pra reparar todo o dano. Tome esta adaga, é com ela que você vai retirar os três fios de cabelo. Esta noite ainda.
Assim que dá as instruções à mulher, Exu bate na porta do palácio e pede audiência com o rei. O chefe da guarda logo manda chama-lo. O rei o recebe sem, no entanto, o reconhecer:
— Meu rei. Preciso lhe antecipar um infortúnio.
— Diga.
— Vi tua mulher sair expulsa do teu castelo. Vi também muita raiva em seus olhos. E de vingança eu conheço bem. Hoje ainda ela tentará te matar. Deita tua cabeça no travesseiro, mas não te deixes dormir.
— Vai-te daqui, louco. Não tenho tempo pra isso.
Saindo do palácio, Exu vai ter audiência agora com o filho do rei que morava numa aldeia perto, como era costume daquele povo:
— Vim a mando do rei, preciso falar com o príncipe herdeiro.
Apressados, os guardas chamaram o herdeiro:
— Diga lá. O que queres?
— Vim mandado por teu pai. Urge que leves tua guarda para o castelo, ainda esta madrugada teu pai pretende atacar o inimigo.
Sem pestanejar, o príncipe vira as costas e vai ajuntar a tropa.
Colocada as peças em seus lugares, Exu volta e senta na mesma pedra, numa esquina perto do palácio. Sem perder o sorriso no rosto.
A rainha, conhecendo os segredos do palácio, consegue entrar escondida nos aposentos do rei. Este não conseguiu dormir com aquele aviso na cabeça. Percebeu quando sua mulher entrou no quarto, fingiu que estava dormindo. Até que viu ela com um punhal na direção do seu pescoço. Assustado com a confirmação da traição e entendendo que a mulher tentava lhe cortar a garganta, o rei pula de uma só vez e começa a rolar no chão com sua mulher. Neste momento, o filho cehga ao palácio e ouve os barulhos vindo dos aposentos do rei. Corre com sua tropa. Ao escancarar a porta, vê seu pai com uma adaga na mão a tentar matar sua mãe. O rei, por sua vez, vê seu filho entrando com suas tropas no quarto e deduz que ele se aliara com a mãe para lhe destronar e termina por desferir um golpe mortal na mulher. O filho, sem entender aquela cena dantesca, saca a espada e mata o pai. A guarda do rei, que chegava na hora, vê o príncipe golpeando o rei e, numa tentativa vã de salva-lo, mata o príncipe.
O barulho foi grande. Mas por trás de gritos de desespero e sons de espada, era possível ouvir-se uma gargalhada. Era Exu. Que agora não só sorria, mas gargalhava. Não só repousava as mãos no joelho, mas dava tapas e mais tapas enquanto arfava e ria.
De uma cabana distante, o centenário sábio repetia com um cachimbo na boca:
— Não esqueça de Exu.
5 de maio de 2021
Moisés e a Terra Prometida
Moisés foi criado clandestinamente pela irmã do faraó, como príncipe do Egito. Aos quarenta anos é exilado e passa a viver longe do reino. Casa-se, tem filhos e aos oitenta anos tem a visão de um matagal a arder em chamas, mas que não se consumia. Ali se dá a sua teofania, a revelação de Deus, onde recebe a missão de salvar os hebreus da escravidão.
Deixa a mulher e os filhos para encarar o faraó e com ajuda do próprio Deus Moisés consegue convence-lo a liberar os escravos. Ele assim o faz, mas logo se arrepende e vai busca-los de volta. Moisés se vê encurralado numa das mais famosas passagens bíblicas. De um lado o exercito do faraó e do outro o Mar Vermelho. Então o mar se abre e os hebreus atravessam. Enquanto o exercito faraônico se afoga nas águas que se fecham.
Depois disso foram mais quarenta anos de caminhada pelo deserto.
Chegando num impasse, o povo hebreu se vê num local onde não há comida ou água. Moisés então vai ter com Deus, que lhe diz:
— Toma a vara e reúne a comunidade tu e teu irmão Aarão. E em seguida e sob os olhos deles, dize a este rochedo, que dê as suas águas. Farás, pois, jorrar água deste rochedo, e darás de beber a comunidade e aos seus animais.
Moisés volta e, ao invés de agir estritamente como o Deus de Israel tinha sugerido, em frente à Israel diz:
— Ouvi, agora, rebeldes: faremos nós jorrar água, para vós deste rochedo?
Dizendo isto bate com força na pedra, por duas vezes, com seu cajado. A água jorra abundante.
Moisés é chamado uma ultima vez por Deus:
— Visto que não crestes em mim, de modo a me santificares aos olhos dos filhos de Israel, por isso, não fareis entrar esta assembleia na terra que lhe dei.
Aos 120 anos, Moisés sobe no Monte Nebo e contempla a terra prometida. Mas lá nunca pisaria. Morreu em cima do monte, sem nunca ter chegado a Canaã, a que jorra leite e mel.
Grande Arquiteto do Universo — por um não maçom
A Maçonaria utiliza um termo, muito próprio, para designar a figura de Deus. Eles o chamam de Grande Arquiteto do Universo, ou pela sigla, G.A.D.U.
Bem, começa então mais um levante conspiratório anti-maçônico. É fácil achar na internet religiosos fanáticos interpelando maçons com perguntas capciosas do tipo “Sim, mas quem é GADU?”, via de regra o maçom humildemente tenta explicar “GADU é um termo genérico, que nós maçons usamos para nos referir a Deus, servindo tanto para muçulmanos, cristãos, judeus ou qualquer outro de qualquer religião." Os religiosos começam com saltos indutivos “Ah, então GADU são vários deuses?; Ah, então GADU é um deus genérico?; Ah, então GADU é o deus da maçonaria?”. Já vi maçons em sais justas, quando perguntam "Então me responda, GADU é o Pai de Jesus Cristo, que também é Deus?" mas, mesmo desconcertado, o maçom cristão explica “Para mim sim, para o Judeu, não”.
Bem, deixemos de lado esse debate capcioso.
Sugiro uma reflexão. Qual é a diferente entre os termos “Deus” e “Grande Arquiteto do Universo”? Bem “Deus” não é o nome de Deus, obviamente. Nem do cristão, nem do judaico, nem de religião nenhuma. Deus é um adjetivo comum, que toda religião usa para designar seu Ser Supremo. Judeus usam a palavra Deus, cristãos usam a palavra Deus e até religiões que O nomeiam — Javé, Jeová, Alá ou os 72 nomes de Deus da Kabbalah Judaica — também usam a palavra "Deus". Então, fica o questionamento: qual é a real diferença entre "GADU" e “Deus”, ou “Pai Celestial”, ou qualquer outro termo, sempre genérico, para designar o Ser Supremo de cada religião? Nenhuma diferença no termo. Mas há de se perceber qual é a diferença que tanto move aqueles debates.
A diferença é a postura. Enquanto os maçons estão preparados para aceitar que o conceito de Deus é diferente pra cada um, eles sabem lidar com estas diferentes definições. O termo especifico — GADU — só é para ligar a ideia de Deus ao universo simbólico maçônico, que é de construtores e arquitetos. Assim como Senhor dos Exércitos, para as tribos guerreiras de israel ou Pai Celestial, ou Senhor dos Senhores, ou qualquer outro dos tantos "nomes" de Deus usados pelas diversas religiões.
É sempre perigoso aceitar as premissas do debatedor adversários.
5 de maio de 2021
Por que sopramos velas?
Nós, seres humanos, somos seres virtuais. Não no sentido contemporâneo que damos à palavra, que é o sentido tecnológico, conexão com a internet. Nós não só somos virtuais, como é esta virtualidade que nos faz humanos. Somos virtuais por que a humanidade é esta capacidade que temos de superar o que é para o que pode ser. Somos seres virtuais por que somos seres simbólicos.
O símbolo é um “elemento representativo visível que, por analogia, substitui um objeto, conceito, ideia ou qualidade”. Esta ideia subjetiva não está no concreto do símbolo, ela é virtual, transcende o obvio e o corpóreo. A cruz, a estrela, uma pomba branca, uma bandeira ou um brasão são todas representações de algo que está para além do objeto que representa. A própria palavra é simbolo. Quando falo “vela”, não há vela. Há apenas o conceito de vela, que você passa a acessar com o símbolo. É com esta ideia que o pintor Francês René Magritte brinca:
A Bruxa
A Bruxa (The Witch — 2016) é um conto de fadas moderno, mas com todos os aspectos dos clássicos contos de fadas. Nós sabemos como Walt Disney maquiou e deixou todos os contos digeríveis para crianças de apartamento e criadas por vó — como eu —.
Os verdadeiros contos, lá dos tempos dos irmãos Grimm, não eram nada como as coisas fofas da Disney. Chapeuzinho come a carne da própria avó, João e Maria são deixados na floresta pela mãe para morrerem de fome, em fim... nada como o brilho dos desenhos animados para apagar a verdadeira forma destes contos.
A Bruxa fez diferente e retomou os moldes clássicos, provavelmente ainda mais sombrios que os contos de fadas originais. Nos mostrou o perigo que é deixarmos de obedecer nosso pai (Deus) e nos afastar-nos da família (Igreja/Comunidade). Mas há perdão em A Bruxa? Acredito que sim.
A oração absolutamente humilhada de William — o pai — provavelmente foi ouvida por Deus, porém, seu fim não foi menos trágico por isso. Lembra-nos que a graça está no céu e não no mundo e que o julgamento de cada um só é sabido e feito pelo próprio Deus. Só podemos supor que William foi perdoado.
A Bruxa é uma tragédia, como todo bom conto de fadas. E as referências aos clássicos foram claras, e até passaram do ponto em uma das vezes — na minha opinião —. Posso citar algumas passagens:
João e Maria quando Thomasin e Caleb vão parar na floresta, por conta da fome que ameaça a família, e se perdem. Caleb encontra a casa de uma bruxa, que o engana com suas delicias; mas é Chapeuzinho Vermelho que saí ao seu encontro, entretanto não é a mocinha ingênua que conhecemos. O Lobo Mal também aparece tanto na mentira de um personagem — William inventa que foi um lobo que roubou o pequeno Samuel — e também na clara referência aos Três Porquinhos que se dá na cena onde casa de madeira é destruida com um assopro. Elementos isolados também são muitos. Corvos, coelhos que trazem mensagem, maçãs que envenenam, crianças que não obedecem aos pais e até bruxas voando em vassouras.
Infelizmente (ou não) a Disney destruiu o verdadeiro caráter dos contos de fadas de um trabalho tão bem feito que quando indicamos as referências em A Bruxa, parece que o filme vai perdendo sua seriedade. Mas não, as histórias são todas sérias, precisamos esquecer esta roupagem pasteurizada e romantizada. Contos de fadas não são pra crianças de apartamento.
4 de maio de 2016
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Caso sua expectativa seja ver um filme simples que apenas lhe cause medo e dê sustos, indico que procure outro filme. A saber disto, sigamos com o comentário cheio de spoillers. Eu, particularmente, não gosto de filmes de terror. Normalmente não aprofundam nada, nem realmente utilizam os elementos místicos que parecem utilizar. Tudo fica estéril e vazio. Não é o que acontece em A Bruxa.
O filme lança mão, de maneira eficaz, da cultura cristã e de sua subcultura pagã. Não é necessário ser nenhum especialista em alguma das duas mitologias, mas é só ter prestado atenção na catequese ou ter ido uns meses à escola dominical que você consegue se envolver com todos os elementos cristãos do filme.
Ele mistura, com qualidade, relações místicas e sobrenaturais, tomando como pano de fundo uma realidade cristã, com relações de família. A mim, pareceu um prato cheio para cristãos, paganistas/satanistas, psicanalistas, psicólogos em geral ou qualquer pessoa que se interesse nas intersecções desses elementos.
O filme começa com um julgamento, onde nós rapidamente nos compadecemos com a família acusada (de algo desconhecido) e expulsa da sociedade e da religião. O pai, com uma voz que dá toda uma aura de autoridade, renega tudo e vai viver com a família no meio do nada.
Vemos começar um declínio vertiginoso de suas vidas, em seus vários aspectos. Eles começam a sentir o peso do afastamento da civilização e, concomitantemente, da religião (que para os cristãos é a mesma coisa). Começa-se a se destruir a família, a fé, a civilidade, tudo entra em um colapso profundo.
Então, o pecado se mostra protagonista. E, um por um, vai derrubando todos exceto Thomasin, a mais filha mais velha.
O pai cai na soberba, o filho mais velho na lascívia, a mãe na vingança e rancor e os gêmeos deixam de guardar o primeiro mandamento — Adorar a Deus e amá-lo sobre todas as coisas —. Identificamos facilmente a falha desta família nos dez mandamentos e na própria tradição da Igreja.
Mas não é só no pecado que o filme se desenvolve, assim como na própria mitologia cristã, o perdão é extremamente presente e profundo. Os homens do filme se arrependem, e pagam por isso, mas se arrependem e se encontrarão no céu. O mesmo não posso dizer da mãe, que foi totalmente engolida pelo rancor e pela vingança. Questão importante, já que suas tentações foram alimentadas pelas mentiras do pai e filho, pelo furto do pai, pela luxuria incestuosa do próprio filho. Mas a mensagem é clara "Cada um que cuide dos próprios pecados. Cada um dará conta de si mesmo no juízo final." Eles se arrependeram a tempo — ou não —.
Os gêmeos me deixaram com uma pulga atrás da orelha. O que houve com eles? Eu não sei. Não eram pagãos, mas sumiram. Porém, é uma pena ser o real e único mistério que o filme deixou no ar.
A questão é que o filme é profundo em sua simbologia, tanto mística quanto psicológica, e eu passaria o dia escrevendo sobre ele, mas acho que ninguém vai ler. Enjoei de escrever. Bjs. Vai orar.
15 de março de 2021
Doze anos com meu avô
Falei a Vovó do vídeo da pegação na NOX. Quando eu to saindo ela solta a celebre frase:
"Cuidados com as câmeras" ADSUHASHUDHUAS MORRI!
Minha avó chegou no quarto e falou "Lembra que eu disse que esse ano iria mudar? Vá lá na sala."
Cheguei lá... KD o sofá?!?!
-Jogasse fora foi vó?
-Eu ia jogar... mas uma irmã tava precisando e eu dei pra ela!
sdhuasduhasuhdhusa Quero ver quando vovô chegar!
Vovô avisou que é pra eu parar de ir pra todas as festas do mundo.
Eu concordo com ele.
Vovó liga pro plano de saúde:
-Alou, queria marcar uma consulta pra medico de coluna
-(atendente fala alguma coisa que não ouço)
-Ah, então da tempo de morrer né? Hehehe
ASDHUASHUDAHUSDHUAUHDAHUS
Vovô chegou = parou violino
Comentando sobre o conservatório com vovô ele vem com "No meio da faculdade tu vem inventar de fazer essas merdas? Vai estudar que é melhor!"
Vovô comprou uma Bíblia de 200 conto! Católica, mas é linda demais, uma obra de arte!
Eu tô com a pupila dilatada, mas eu descobri que é só usar o óculos de vovô que da pra enxergar, é incrível! Mas a cabeça já ta doendo =X
Vovô sobre flauta doce: "Num é possível que eu num aprenda uma besteira dessa" Bora vê asdhuasuhduhasud
Vovô:
— Na minha porta não passa viado!!! — eu me choco, mas ele conclui — "não moro nas selvas!
Apareceu uma família, amigos de vovó e vovô, pra decorar tipo uma festa pra chegada desles! TEM UM MONTE DE GENTE ASDHUASUHDHUSA
Vovô fez compras TEM TRELOSO DE CHOCOLATEEEEEEE AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA
Já veio o comentário de Vovô "Viu a reportagem do lugarzinho que vc gosta de ficar?" PQP
Vovó faz com o telefone o que eu faço com o facebook, só que umas três vezes melhor. Recife já sabe do meu desmaio asduhasuhdasuhdhu
Aniversario de vovó!
Vovô acabou de passar a msg: Nada de visitas.
Vovô me chama de mente imatura e depois pede pra eu não me ofender.
Ainda passa Caverna do Dragão na Globo pow, vi agora! O melhor foi minha avó... Quando Presto começou "Abracazam...." Vovó "Oush... esse menino ainda não aprendeu a soltar magia?" asuhdauhsdhuashudashud
Pois é vó.... Mais de 20 anos e nada....
Graças a Deus, vovô comprou meu remédio!
Amanhã começa o tratamento. 10 comprimidos por dia durante uma semana!
Vovô colocou a tv a cabo da GVT, é sete vezes mais barata que a Sky HD e a imagem é igual asdhuasuhdasuhduh
Eu num tenho dinheiro pra comprar, mas dei um presente legal pra vovô!
*-*
Vovô ta estudando psicologia na pós de teologia.
Senta que lá vem historia....
04 de Março de 2012
A tv do quarto de vovô pega MKV PIREI MALUKO!
Vovó ta assistindo Once Upon a Time agora
Tenho uma foto deitada de Dalí, um retrato bem famoso dele.
Vovô entrou no meu quarto e perguntou se era eu ahahahaha
Vovô me acorda cedo, pra nada e agora de tarde vai dormir.
¬¬'
Vovó e Vovô me surpreende vez ou outra.
Acabaram de me dizer que assistiram O Retorno do Rei ontem e adoraram. Pediram pra eu baixar o I e o II asduhasudhu
Tour no Recife Antigo com Vovó e Vovô!
CADEIRA NOVAAAAAAAAA!
AINDA BEM GRAÇAS A DEUS!
Minha coluna tava indo pro beleleu naquela cadeira de praia.
Muito obrigado Vovô Romualdo, cadeira massa!
A muito tempo eu tava precisando disso e a muito tempo eu tava querendo fazer.
Comprei todo o material (Deu R$40,00) e quando eu tava pronto pra fazer, vovô disse que eu ia incendiar a casa se eu tentasse montar --'
Pedi assessoria à uns amigos engenheiros, arquitetos e psiquiatras e vi que dava pra fazer.
Taí, agora posso ler deitado sem precisar levantar pra apagar a luz!

Vovô me mostrou um e-mail que ele recebeu falando sobre os projetos que Marta Suplicy defende. Acho que ele me deu pra ler pra eu demonstrar minha indignidade frente às campanhas que Suplicy tem a favor dos homossexuais.
Mas ele estava certo. A minha indignação foi grande. Não pelo discurso falacioso da bancada evangélica contra as propostas. Muita mentira, muita interpretação má intencionada etc. Mas minha grande indignação é no argumento nojento, filho da puta, absurda, leviana, e safado... Que diz que Suplicy, e qualquer outro movimento contra homofobia, quer legaliza a pedofilia.
Bancada Evangélica, Bolsonaro, Malafaia e cia. ltd. sempre vem com esse absurdo!
Eu fico sem palavras para expressar a raiva que eu sinto.
E isso é o carro chefe dos textos de contrapropaganda ao movimento GLBT's.
Foi só vovó ver um viado no BBB que ela me chamou.
(?)
Eu to só escutando as musiquinhas armoriais vindo da sala.
Vovó e vovô assistindo Luiz Gonzaga.
Só pode escutar essas músicas aqui se for trilha sonora né? Entendo...
Que bonitinho, vovô me chamando pra viajar!
Irmã do meu avô veio aqui em casa, ela mora no Rio de Janeiro.
Ai eles comentaram comigo que parece que da pra ver pelo gugle.
Ai eu disse "Tem sim, bora lá."
Deu pra ver a casa, obviamente. Mas também tavam o cunhado e o sobrinho de vovô na porta de casa!!! HAHAHAAHAH
Vovô disse que realmente dois homens não podiam se casar.
A prova disso era que até as tomadas tem macho e fêmea.
Eu comecei a rir achando que era uma piada.
Ai eu vi que era sério.
ok.
Instalei o Win7 no PC de vovô com o mesmo CD que instalei o meu.
O dele ficou em inglês, só pra eu sair com fama de que não faço nada direito... --'
Vovô me veio com uma "proposta" de ter um celular sem internet.
Eu disse que não era bom pra mim.
Acho que se eu tivesse sambado na farinha ele teria visto mais sentido no meu comportamento.
Vovô dizendo que eu era muito estressado pra ser psicólogo.
Lembrei a ele que ele era pastor... Mas acho que não serviu pra muita coisa não.
Queria comprar um tarô bem bonito!
Mas vovô ia pirar.
Uma vez eu achei um terço na praia. Foi tão bonito. Eu tava molhando os pés no raso, veio uma onda e algo se enrolou no meu calcanhar, quando eu vi, era um terço!
Achei tão lindo. Guardei
Ai um dia vovô viu ele em cima da mesa e jogou ele pela janela. --'
Eu vejo aquelas possessão demoníaca na universal... Eu acho graça.
Aquilo ali num passa de diabrete histriônica.
Quer ver alguém com o djabo no coro? Veja vovô estressado!
Meu avô é Cavalcanti.
Ai esses dias eu tava lendo sobre a revolta Praieira e vi a importância dessa família na revolta. Ai eu achei uma quadra popular que se referia à família. É A CARA de vovô
sduhasuhdasuhdhusa
"Quem viver em Pernambuco
não há de estar enganado:
Que, ou há de ser Cavalcanti,
ou há de ser cavalgado."
Eu sei que é besteira. Mas me dá uma agonia quando eu vou ajudar vovó em alguma coisa no Facebook e vejo que tem 105 notificações pendentes...
Parece fricote do tipo "Ai Cayo... O que tu tem a ver com isso?" O problema é que vovó é do tipo que acha que se vc não fala ou não responde ela no face, vc não é mais amigo dela e ela deleta vc e bloqueia ahahahahaha
Sempre fui o xodó de vovó e vovô.
Vovô compra presunto pra uma tropa inteira.
Acaba que se estraga muito presunto aqui em casa.
Mas dessa ultima vez ele se superou.
Mas pense que eu to trabalhando pra não estragar! HAHAHAHAH
Cada sanduiche meu leva, em média, umas três fatias. E enquanto eu tô preparando eles, eu ainda fico comendo presuntos avulso hahahahaha
Olha só, vovó lendo Nelson Rodrigues!
Vovó terminou "Perdoa-me por me traíres" em 50min!
Disse que adorou, ficou emocionada. Só não me deixou pegar outra peça pq disse que se começasse não ia parar e tinha umas encomendas de bordado pra entregar!
Que maravilha!
Vou ficar "esquecendo" as peças no sofá da sala a partir de agora hahahahaha
Como é bom comprar algo que vc queira!
Tinha um livro na Saraiva que eu paquerava a anos. "The Eclipse" de Abraham Chachamovits. Não achava ele usado, nem em canto nenhum. Juntei moeda, dinheiro que vovô me deu hj e dividi em duas vezes no cartão pq comprei já outros livros esse mês. E agora ele está aqui. É meu!
Ai quando ver.... A peça é uma merda.
Vovó me xinga. Eu digo "Não me xingue, pq eu não lhe xinguei." E ela responde "Não venha dar uma de psicólogo não."
Agora fodeu.
Eu nunca gosto quando eu ouço "Fulaninho parece contigo, Cayo." Eu não gosto porque eu nunca acho a pessoa bonita e acabo achando que o povo também não me acha. Vovô acabou de dizer que eu sou a cara do Deputado Diogo Moraes. =~
Que feliz!
Ganhei um Samsung Galaxy S2 Lite de Vovô!!!!!!!!!!!!!
Cheguei na cozinha fofocando de vovô pra vovó "Ô VÓ O QUE È QUE VOVÔ TEM EIM!?"
Ela tava no celular com ele.... --'
Só vi ela dizendo "Pronto, ai quando vc chegar vc fala com ele."
ok.
Vovô reclamou das roupas que eu usava... e do meu bigode.
Falou que eu preciso entender que existem outras pessoas no mundo e que eu preciso pensar nelas. E como a roupa que eu visto machuca ele, eu preciso pensar nele, pq se não eu não tenho coração.
A reciproca não é verdadeira... Mas vamos lá. Usar a roupa que vovô quer, pq eu não pago minhas contas.
Vovô sempre foi contra passeatas.
"Não serve pra nada."
"É um bando de desocupado."
"Não quero você metido nessas coisas."
Mas foi só entrar num sindicato, que foi pras ruas lutar pelos seus direitos.
Interessante.
Minha gente. Comecei a assistir "Saving Mr. Banks" e no começo do filme, tem uma versão de "Chim Chim Cher-ee" tocada no piano e recitada por Colin Farrell.
Vovô escutou e adorou. Pediu pra eu colocar pra ele no Youtube. Eu coloquei.
Isso já bastava pra ser espantoso e espantosamente novo. Mas não parou por ai. Ele começou a olhar os videos relacionados e está escutando clássicos da Disney interpretados no piano! Com cara de "Que coisa bonita". Agora mesmo, estou ouvindo vir do quarto dele "Once Upon A December" de Anastasia!
Eu acho que se eu fosse um filho um pouquinho melhor, vovô me dava esse iPhone 5 dele!
"Qual a buniteza que tem nisso aí?"
-Vovô. Sobre o Cais.
Não da pra conversar com vovô.
Eu posso passar sete anos sem falar com ele.
Assim que surge o primeiro assunto, vira briga e ameaça.
Vovô me deu R$140,00 pra passar o São João. Se eu gastar mais de R$5,00 eu me dane!
A não ser que inventem esse negócio de cotinha pra comprar coisa!
Já escuto o som do meu trompete!
Vovô sobre o filme de Noé:
-Gostei não, muito fantasioso.
Vovó fez um comentário do filme que eu achei genial.
[spoiller]
Tubalcaim está tentando perverter Cam dentro da arca, ai minha avó comentou "É a segunda serpente..."
Achei genial!
Vovó fica vendo vídeos de gays se convertendo e virando hetero.
Só observando...
Vovô comprou um binoculo de R$200,00!
Menino! Botou quente...
Mas ele quer um desses desde que eu sou pequeno, deveria ter comprado um de R$500,00
Vovô comprou um binoculo, lembram?
Ele pagou dia 18, sexta passada.
Que inveja... O binoculo já saiu pra entrega. Hoje mesmo chega.
E eu aqui esperando as coisas do AliExpress...
Vovô consegue ser grosso até pra dar boa tarde. --'
Vovó acha que eu sou o designer oficial da Igreja.
Quantos equívocos em uma frase só....
Um dia eu enlouqueço ou me liberto (da neurose) de vovô.
Ele odeia música alta e principalmente quando a musica é do mundo (musica não evangélica). Não interessa se é Mozart, Beethoven, Bach ou qualquer outro gênio da musica. Se não for gospel, não presta. (E tem que ser gospel em português e das ultimas duas décadas. Nada de colocar corais gospeis americanos, Elvis, Bob Marley ou qualquer que seja a musica sacra de antes do seculo XX.)
Ai ele me deu de presente uma caixa de som Subwoofer enorme. --'
Conversei duas horas com vovô, sem brigar.
Falamos de politica, comportamento e, um pouquinho no final, sobre religião.
Duas horas.
Duas horas.
E ninguém saiu ferido!
Eu não dormi de ontem pra hoje. Cheguei em casa, fui conversar com vovô. Esqueci que tinha trabalho... E amanhã tenho que acordar de 6h.
Que bom.
Vovô perguntou hoje o que eu queria ser.
Ai eu "Pode ser assim só o sonho?" ai ele "pode"
Ai eu "Eu queria ser psicologo clinico, palhaço e professor de teatro e palhaçaria."
Ai depois ele passou meia hora discursando como meu sonho era idiota.
Vovô falando com a telemarketing do cartão:
-Meu sinhô, casamento a gente faz diante do Juiz, de Deus e do Pastor e a gente se divorcia, quando mais cartão de crédito.... Eu não quero continuar com o cartão e ponto final.
Acabei de chegar do RHP, tenho um priminho novo. Coisa mais linda, mas antes de falar disso, teve uma coisa que preciso dividir com os fãs do meu avô.
Tava no estacionamento, quando entra uma caminhonete com uma bandeirona da dilma flamulando. O mastro era maior do que devia e arrastou duas lampadas fluorecente do teto. Foi um barulhão! Vovô não perdeu a oportunidade:
-É Dilma acabando com tudo!
HAHAHHHAHAHAHA
Foi tão engraçado que até o dono da bandeira ficou rindo e fazendo piada também!
Vovó:
-Olhe, arrumei seu guarda-roupa. Ta tudo no cabide agora. Mas veja, tem camisas de mais de dez anos. Umas você nem usa mais. Deixei tudo lá, não mexi em nada. Não mexi pq não ia pegar tudo e jogar fora, vc poderia ficar chateado. Mas veja ai o que não quer mais.
"não ia pegar tudo e jogar fora, vc poderia ficar chateado"
"PODERIA?"
Respondi:
-Quem ia chorar eram vocês com o que eu ia jogar fora. ¬¬'
Vovô comprou 16 litros de Coca-Cola.
Adeus saúde.
Pra que eu fui falar a vovó que sei fazer cartaz?
Vovô e vovó falando sobre adoção.
Saiam da sala.
Vovó torceu o tornozelo e está no gesso.
Na mesa da cozinha, na hora do almoço:
Diarista: Seu Romualdo, tem pimenta?
Vovô: Tem sim, ta com Dalva lá no quarto.
Diarista: Mas ela ta comendo pimenta? Com o pé daquele jeito?
Vovô: Ela ta comendo com a boca, não com o pé.
Cayo: AHSUHDASHUDAUSHDHUADHUASUDHASUH
Pra qualquer pessoa que me segue, é conhecido o fenômeno das minhas reuniões em família. Hoje, na hora do almoço, nós três (Eu, minha avó e meu avô) tivemos um lindo dialogo e delimitamos bem nuances de nossas personalidades. Ajudas mutuas e autorreflexão. Divido com vocês esta historia.
Meu avô ganhou um Sansung Tab 4. Bonito, grande, interessante. Vovó logo pediu ele pra si. Vovô desdenhou o aparelho "Não serve de nada pra mim..." mas mesmo assim, não quis abrir mão. "Pra que tu vai querer ele?" perguntou à minha avó.
-Eu tenho dois motivos óbvios - começou explicando, mas em tom de brincadeira - O primeiro é pra ver meu Facebook e o segundo, obvio, é pra eu me amostrar.
-Eu acho motivos absolutamente validos vó - comentei - até pq o segundo motivo é um dos principais motivos para compras de celulares e tablet's hoje em dia.
Mas vovô não deu o tablet. Mudamos um pouco de assunto.
Comecei a falar da arrumação de meus livros.
-Resolvi arrumar meus livros ontem, mas na metade eu já tinha desistido. Deu uma preguiça. Mas terminei de arrumar.
-É muito livro mesmo, vou pedir pra Nalva - Nalva é nossa diarista, vem quinzenalmente às quintas - pra arrumar.
-Ah, ela não consegue. Já conversou comigo, disse que é muito trabalho arrumar na mesma ordem que estava, e eu concordo. É muito livro... Muito papel. Já não tenho espaços na prateleira. Depois que eu comprei o Kobo, nem compro mais livros. Só se realmente não achar ele na internet. Esses livros, assim de papel, só servem pra duas coisas; Pra poder folhear e pra poder se amostrar. Ontem mesmo eu postei uma foto deles, pra me amostrar. Mas é tudo uma grande besteira.
-Então tu gosta de se amostrar? - Perguntou meu avô em tom de brincadeira.
-Às vezes... Mas me esforço pra, ao menos, estar consciente de que é só amostração, nada além disso.
-Sei... - Aqui, meu avô já estava sorrindo meio debochado, achando graça das nossas amostrações, minha e de minha avó - Eu nem ligo pra essas coisas. É como eu disse a Dalva, nem preciso do tablet pra nada. - Pausa - Mas pensando aqui, acho que eu não me amostro com nada, eu não tenho essas coisas. -Pausa - Eu me amostro com alguma coisa, Cayo?
- Poder. - Respondi sem pestanejar, certeiro e rápido - o senhor passar o dia se amostrando com isso.
Boa tarde amigos.
Hoje venho aqui trazer uma boa nova. Pra mim.
Vovô vai me dar um iPhone 5s.
Desde já, boas festas.
*fogos*
Vovô falando sobre Candomblé.
Pega a pipoca.
Pipoca, hãn hãn, sacou?
Eu não consigo me acostumar com isso. Sério. Vovô usa outro código linguístico, que eu tenho uma séria dificuldade em decodificar.
— Cayo, vc pode fazer esse livro pra mim?
— Posso vô — já falo com medo de ser mal interpretado — eu tenho os programas que precisa.
— Pode mesmo?
— Posso sim.
— Certo, mas não tem pressa nenhuma — pega um livretinho religioso da bolsa — precisa fazer agora não, pq esse livro já uso a anos e não tem pressa pra fazer. Só que não queria perder ele.
— Certo, vou recuperar ele.
— Pronto, só não precisa fazer rápido.
— ok.
Isso faz umas três horas. Ai agora:
— Já fez?
— Fiz o que?
— O livrinho Cayo, ta pronto?
— N-não, vó.. o S-senhor disse que.. que. que não precis...
— Me dá, precisa fazer mais não.
— Mas..
— Precisa não, eu mando outra pessoa fazer.
Eu posso estudar computação quântica no Himalaia celeste. Mas, se qualquer analfabeto me desmentir sobre computadores, vovó e vovô dão mais credito pra ele. --'
Chegou a Siri em português na nova atualização do iOS. Fui mostrar pra vovó a tecnologia.
— E aí Siri! — esse é o comando de voz em português — Qual o clima de hoje?
Prontamente a Siri me deu o resumo do clima de hoje, ensolarado e agradável. Indiquei que minha avó experimentasse.
— E AÍ SIRI?! — grita minha avó, se inclinando pra perto do celular.
Não funcionou...
— Acho que a senhora gritou muito, vó.
— E aí siri? — dessa vez sem gritar, mas ainda se inclinando pra falar. — Pra onde Cayo vai sair hoje de tarde?
Obviamente a Siri não entendeu a pergunta, ficou confusa coitada.
Meu avô, que passava pelo corredor, fica curioso e pede pra experimentar também.
— E AÊ SIRI — não entendo o pq deles gritarem sempre — QUAL O NOME DA NAMORADA DE CAYO?
Mas dessa vez a Siri resolve responder....
— Deseja ligar pra Romário?
Foi meio constrangedor. Eu nem conheço nenhum Romário... Todos rimos. Meio sem graça.
Bem, de qualquer maneira, agradeço que a Siri ainda não seja tão inteligente pra responder tudo que perguntam.
Vovó e vovô foram pra um casamento, eram umas 18:15, chegaram agora de 01:05.
Eu ainda não comecei a trabalhar, me sinto meio inútil aqui em casa. Assim que eles chegaram:
— Passei a noite estudando. — eu tentando ter alguma utilidade no universo — assisti umas seis aulas.
— Estudando o que?
— Filosofia.
— Hm.
Acho que a ultima aula que eu tive na noite. Uma aula sobre poder de síntese e expressão profunda em um onomatopeia monossilábica.
Eu acho que vovó não gosta quando eu conto alguma coisa que descobri sobre a cultura Yoruba. Acho que ela escuta minha historia assim:
— Vovó, sabia que na cultura Yorubá blá blá blá blá blá blá do Candomblé e blá blá blá blá os Orixás e blá blá blá blá dos Orixás fora que blá blá blá Candomblé e Umbanda?
Isso deve explicar a cara que ela fica toda vez que invento de contar uma historia.
Pra mim, sinceramente, pior que ser assaltado é vovô me culpando pelo assalto.
Mas eu já esperava.
Vovô veio conversar comigo, depois do assalto.
Tópicos dados:
> Você pediu pra ser assaltado.
> Você tá pedindo pra morrer.
> Quem manda viver nos barzinhos do Recife antigo? Você é bohemio?
> Você é frouxo, muito maricas. O cara com uma faca e você não reagiu?
> Quem manda tocar flauta, violão e andar de patins?
> Ta fazendo o que de noite? Noite é hora de marginal, ladrão.
> E o cartão? Que tanto gasto é esse?
(Faz um mês que eu falei "Vô, to precisando economizar no cartão, né?" Respodeu "Não... Ta dando o preço que é pra dar")
> Que tanta compra é essa na Livraria Cultura?
> Pra que tanto livro?
> Seus estudos já acabaram.
> Aprenda a viver. Você é muito imaturo.
> Pare de gastar o dinheiro dos outros assim.
Desta vez escutei tudo calado.
De cabeça baixa.
Mais envergonhado e humilhado que o ladrão.
Vovô comprou uma lâmpada LED pro meu quarto. 87% de economia de energia e muito mais clara.
Chega eu to achando estranho meu quarto tão iluminado! hahahah
Vovó me aparece com uma foto que ela tirou da tela do computador, com o celular dela, com tipo o templete de um site, ou pagina do face, tipo uma imagem de capa. "Quero fazer um logotimo assim pra igreja."
Pronto. Os alarmes da minha cabeçam tocam, todos ficam nervosos, o sistema em modo de alerta vermelho — vai ter treta.
Tento "Mas assim, isso não é um logotipo" e antes de eu terminar a frase vovô já vem com as grosserias dele "Mas pode ser! É só fazer se e pronto, vira logotipo".
Faço silencio.
Vovó segue com a explicação "Mas no lugar dessa arvore de flores, quero uma lua e estrelas e tem essa mulher dançando e essas cores aqui".
Bem. Um dos grandes problemas de comunicação aqui de casa são esses. Vovó e vovô me veem fazendo coisas lindas no pc, mas nunca pra eles. Mas pq? Pq eu nunca faço o que eu quero. Eu não sei desenhar, eu não sou designer e não sou bom no photoshop. Eu faço tudo "como dá pra fazer". NADA é predefinido. NADA fica como tava na minha cabeça.
Mas pra eles. É a pura essência da má vontade. Fica todo mundo de cara feia e me lembrando que eu só sou um estorvo em casa. E nem pra fazer um "logotipo" sirvo...
O alarme da igreja de vovô apitou. Vez ou outra isso acontece, alarmes falsos, preferi não acorda-lo. A igreja tem um sistema de segurança que posso ver câmeras on-line pleo celular, fui verificar pra ver se não tinha nada acontecendo.
A questão é, a câmera interna funciona com infra-vermelhor, naquelas imagens de filme de terror tipo Atividade Paranormal. Você tem noção do que é ficar olhando pra dentor de uma igreja, com visão infra vermelho? To orando pra não ver nada se mexendo aqui hahahahaahahahaha
Momento que eu tomo consciência de que praticamente todos os livros que eu tenho, meu avô que comprou para mim. Ou seja, estou doando mais de mil reais de presentes que vovô me deu.
Não sei como ele vai lidar com isso.
01 de Abril de 2016
Passando pelo escritório (leia-se quarto da bagunça aqui de casa) vejo uma pilha de livros que eu tinha jogado fora.
— Vocês pegaram livro do lixo foi?
Ai vovó responde cheio de tristeza na voz:
— Claro... Tinha livro meu e do seu avô.
— É o que? Só tinha livro meu. Ou por que comprei, ou pq foi dado. Mas todos meus. Que livro é esse de vocês?
Minha avó pega um livro e mostra uma linda dedicatória:
"Dos seus netos Vinício e Matheus, com muito amor"
— Vó, eu tenho esse livro a uns sete anos e nunca li. A senhora leu?
— Claro que li, Cayo! Foi presente dos seus irmãos.
De repente cai um cartão de visita. O cartão de visita era da loja do avô paterno dos meus irmãos.
— Vó, eu lembrei agora... Isso foi um presente de Vinício e Matheus pro avô paterno deles. Provavelmente ele não leu, os meninos não leram, eu também não li e com certeza a senhora nunca nem viu esse livro.
— AI CAYO! TAMBÉM NÃO PODE FALAR NADA QUE TU VEM COM SETE PEDRAS NA MÃO!
Minha gente... Não basta guardar tudo, ainda tem que trazer coisa do lixo pra dentro de casa?
01 de Abril de 2016
Estava eu na sala, começou a conversa em família com meu avô falando:
— Cayo, perguntei a tua vó e ela não soube responder, talvez tu saiba. Um menino no repórter falou que mais de 90% da renda dele vinha das redes sociais. Como pode isso?
Vovô é uma pessoa que não conhece as profissões. Pra ele, fotografo não é profissão, músico não é profissão, ator não é profissão e por aí vai. Não é coincidência que todas as profissões citadas foram profissões que eu cogitei, mas desisti por ter achado que precisava da aprovação dele. Então, respirei fundo e expliquei:
— A maioria dessas pessoas têm muitos seguidores, vô. Coisa de centenas de milhares, as vezes milhão. Daí é simples, alguma empresa faz acordos de propaganda e pronto, tá feito. Às vezes contratos de muito tempo, as vezes para uma campanha publicitária. E assim a pessoa vai ganhando seu dinheiro. E, em certos casos, a depender da rede social, a pessoa ganha dinheiro da própria rede. O YouTube, por exemplo, paga uma fração de dólar por cada visualização que recebe.
— Mas rapaz, que interessante. E por que tu não faz isso?
Por que vô? Por que eu achei que tinha que suprir todas as suas necessidades neuróticas de "um emprego decente", por que eu achei que tinha que superar suas expectativas no minimo, ao menos, por que eu não tive o menor estimulo pra fazer nada da minha vida e tudo que eu quis era sem importância e deveria ser boicotado. Mas obviamente eu não falei isso, Só falei:
— Verdade, né vô? Já pensei, mas sempre acabo desistindo.
— Oush, bicho besta.
Vovó gritou da sala:
— Cayo! Da um pulinho aqui, faz favor.
Fui lá correndo, dei um pulinho e voltei.
Fiquei esperando os risos.
Ninguém riu.
Vovô foi tomar chimarrão. Ele tinha tudo que precisava pra fazer. Fez. Foi beber:
— Que negocio ruim da pega.
Voltou na cozinha, demorou um tempo e voltou bebendo de novo na cuia. Achei estranho:
— Ué, num era ruim que só? O senhor foi fazer outro?
— Coloquei café.
Meu avô pegou COVID pela segunda vez entre uma dose e outra da vacina. No ultimo dia antes da melhora, ele assistiu um culto pela TV. Lá aparecia um homem dizendo que Deus fez ele vomitar o corona. Não deu outra... Na hora do jantar, meu avô orou. Depois do jantar, correu e vomitou tudo, inclusive corona (SIC).